Após 17 anos, o ator interpretou Wolverine pela última vez. Nas filmagens houve banhos gelados e muitas lágrimas. O filme já está nos cinemas portugueses.
Quando a promoção de “Chappie” (2015) estava a terminar, o realizador desse filme, Neil Blomkamp, perguntou a Hugh Jackman qual seria o próximo passo na saga “Wolverine”. Ele, percebeu naquele exato momento, não fazia ideia e ficou a pensar no assunto. Nessa noite, depois de uns copos de vinho, acordou às quatro da manhã, pegou num gravador e começou a debitar ideias. Basicamente, o capítulo seguinte da história seria uma mistura entre “Imperdoável” (um assassino reformado que aceita um último trabalho), “O Wrestler” (um pugilista retirado encontra um propósito fora da luta) e “Shane” (sobre um atirador que tenta contentar-se com a vida familiar).
Era só desse empurrão que James Mangold precisava para começar a construir a história de “Logan” — em exibição nas salas de cinema portuguesas desde quinta-feira, 2 de março. Em entrevista à revista “Entertainment Weekly”, o realizador explicou que depois de “Wolverine” (2013), teve de enfrentar durante algum tempo “a folha em branco”. Depois, com a ajuda de Jackman, decidiu que não queria fazer o típico filme de super-heróis mas sim conseguir uma versão “refrescante”. Nasceu então um relato que junta família, amor e perda. “É sobre a dedicação e lealdade em relação a um pai debilitado, a dedicação, lealdade e responsabilidade em relação a uma criança”, disse.
Em “Logan”, a personagem está agora mais velha, longe do seu auge e vive junto à fronteira mexicana. É lá que toma conta do muito debilitado Professor Charles Xavier (Patrick Stewart) e aceita ajudar uma miúda de dez anos, Laura (Dafne Keen). Depois de interpretar a personagem durante 17 anos em vários volumes da saga “X-Men”, Hugh Jackman decidiu que esta seria a última vez.
Além de ter outros projetos pendentes, dois motivos foram decisivos: a idade (o australiano tem agora 48 anos) e o cancro. Aliás, Jackman fez no final de fevereiro o sexto tratamento para lutar contra a doença. Ainda assim, no programa “Live! With Kelly” desta quinta-feira, 2 de março, garantiu que não há motivos para preocupações.
“É cancro da pele mas a forma menos perigosa. É só algo que eu tenho de tirar por ser um australiano com pais ingleses”, brincou enquanto ainda era visível um penso no nariz.
O primeiro carcinoma das células escamosas foi-lhe removido em novembro de 2013 e, desde então, tem falado inúmeras vezes do problema e alertado os seus seguidores no Instagram de forma recorrente.
Curiosamente, Jerry Seinfeld também influenciou a resolução. “Ele estava a dizer-me porque tinha terminado ‘Seinfeld’ […] Disse que tinha sempre tido a sensação e a crença de que nunca sabes quando é que a tua energia ou a do público vão acabar e alguém vai dizer: ‘Oh, por favor, vai-te embora.’”, recordou numa passagem pelo programa de Jimmy Fallon.
Todo o processo para o terceiro e último “Wolverine” (depois de “X-Men Origens: Wolverine”, de 2009, e “Wolverine”, em 2013) foi extremamente emotivo.
Pela primeira vez na sua carreira, Hugh Jackman trabalhou com um professor de representação, que lhe ensinou muito sobre a personagem, mas também sobre ele.
“Acho que não teríamos feito este filme se eu não soubesse que seria o último. Os riscos triplicaram para mim, não havia rede de segurança”, confessou ao jornal “USA Today”.
Na estreia em Berlim, Jackman e Patrick Stewart acabaram o filme de mãos dadas e a chorar
O ator aceitou uma redução no salário para garantir que o filme seria produzido para receber a classificação R-Rating (proibido a menores de 17 anos sem acompanhamento) e, para o papel de um homem desgastado e perdido, inspirou-se na prestação de Michael Keaton em “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”. Para chamar menos a atenção, o projeto começou por se chamar “Juarez” e as filmagens aconteceram em Nova Orleães.
Para se preparar, os dias de Jackman tinham seis refeições, geralmente todas entre as 10 horas e as 18 horas, o que significa que passava longos períodos sem ingerir alimentos. A carne fazia parte de muitos pratos mas tinha de ser cozinhada a vapor e sem qualquer condimento.
Havia ainda treinos com o PT Mike Ryan. As sessões costumavam durar quatro horas e começavam às quatro da manhã. Antes e depois, o ator tomava suplementos de proteína para definir ainda mais os músculos. Antes das filmagens, tomava sempre um banho gelado que o ajudava a limpar a cabeça e a entrar na personagem. Nos dias de cenas em tronco nu, chegava a passar 36 horas sem beber água. Isto servia para eliminar a retenção de líquidos e tornar o corpo mais definido.
Em toda a duração de “Logan”, Hugh Jackman usou uma pedra debaixo do calcanhar. Não era uma dor insuportável mas era um incómodo criado para ele estar sempre ciente do estado mental e físico da personagem — o truque foi herdado do colega britânico Jim Broadbent.
Numa entrevista durante o programa “The Dr. Oz Show”, Hugh Jackman explicou porque é que não voltaria a retomar o papel.
“Senti que era a altura certa para fazê-lo e, sejamos honestos, foram 17 anos. Nunca pensei, num milhão de anos, que duraria, portanto estou grato aos fãs pela oportunidade de interpretá-lo.”
Patrick Stewart, que foi o professor Charles Xavier sete vezes durante o mesmo período, também decidiu seguir o mesmo exemplo. Tudo porque ficou demasiado emocionado na estreia mundial em Berlim, onde os dois assistiram ao filme sentados lado a lado e acabaram a chorar.
“Quando chegou ao final muito emotivo… reparei que o Hugh estava a limpar uma lágrima. Depois eu fiz o mesmo”, contou Stewart no programa “The Graham Norton Show”.
A seguir foi o descalabro: “Nos créditos, ele segurou-me na mão e fiquei acabado. Eu estava a chorar e a soluçar.”
Para o papel, o ator perdeu 9,50 quilos, transformação que nunca tinha feito antes. Nas cenas em que Logan carrega o professor X não houve duplos, foi sempre o próprio Jackman a pegar em Patrick Stewart. A dada altura, a sua personagem e Laura (Dafne Keen) são vistos a assistir a “Shane”, um dos filmes que inspirou este projeto.
As críticas a “Logan” têm sido todas positivas. “Emotivo”, “um filme pesado”, “talvez o melhor “X-Men” de sempre”, “o mais violento mas também o mais sentimental” foram apenas alguns dos comentários feitos ao filme realizado por James Mangold (responsável também por “Walk the Line”).
O próprio ator admitiu que nunca se tinha sentido tão vulnerável. “Não sinto que tenha encontrado o coração da personagem até fazer este filme”, disse na conferência de imprensa do Festival de Cinema de Berlim.
Hugh Jackman confessou que em certas cenas chegou a ficar com lágrimas nos olhos, incluindo o momento em que carrega Laura às cavalitas ou nas interações com o professor X.
“Queria fazer um filme do qual alguém que nunca tivesse visto um filme de comics pudesse retirar algo”, explicou ao “The Sydney Morning Herald”.
Apesar de tudo, o ator já explicou porque não vai ter saudades de “Wolverine”.
“Ele não vai a lado nenhum. É parte daquilo que eu sou e algo a que estou muito, muito grato.”