Devido às notificações de casos de rabdomiólise (doença de Haff) de causa desconhecida, possivelmente associados ao consumo de peixes no Amazonas e em outros setes Estados, a Secretaria de Saúde de Roraima, por meio da Coordenação Geral de Vigilância em Saúde e dos Departamentos de Vigilância Sanitária, Epidemiológica e Ambiental, juntamente com a Superintendência do Ministério da Agricultura em Roraima, Divisão de Agricultura e Pesca do Mapa, e Universidade Federal de Roraima, em nota conjunta, informam à população.
A rabdomiólise é uma síndrome decorrente da lesão de células musculares esqueléticas e liberação de substâncias intracelulares, na maioria das vezes, relacionada ao consumo de álcool, atividade física intensa, compressão muscular, imobilização prolongada, depressão do estado de consciência, uso de medicamentos e drogas, doenças infecciosas, alterações eletrolíticas, consumo de peixes, entre outras1.
A característica clínica da rabdomiólise envolve: mialgia, hipersensibilidade, fraqueza, rigidez e contratura muscular, podendo estar acompanhada de mal-estar, náusea, vômito, febre, palpitação, redução da urina e alteração da coloração da urina (castanho-avermelhada).
Uma das doenças na qual a rabdomiólise está presente é a doença de Haff, também conhecida como “doença da urina preta”, que é uma síndrome, ainda sem causa definida, caracterizada por uma condição clínica que desencadeia o quadro de rabdomiólise com início súbito de rigidez e dores musculares e urina escura. Os estudos epidemiológicos relatam que o período de incubação da doença é até 24 horas e que o início dos sinais e sintomas ocorre após o consumo de pescados cozidos2-3.
A clínica da doença acompanha diversas alterações nos exames laboratoriais dos indivíduos acometidos, em que se destaca como exemplo aumento considerável de creatinoquinase (CPK) sérica, acompanhada de mioglobinúria e aumento potencial nos níveis de outras enzimas musculares (lactato desidrogenase, aspartato aminotransferase, alanina aminotransferase -ALT)2.
Segundo o Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde – CIEVS, em 2020, foram notificados 51 casos suspeitos de doença de Haff, distribuídos nos Estados da Bahia (45 casos) e Pernambuco (seis casos).
O Estado da Bahia notificou 45 casos suspeitos de doença de Haff, sendo 40 casos compatíveis para doença e cinco descartados. Os municípios com maior predominância de casos confirmados foram Salvador (17 casos) e Camaçari (16 casos). Os demais municípios apresentaram entre um a três casos, sendo Entre Rios (três casos), Dias D`Ávila (dois casos), Candiba e Feira de Santana, ambos com um caso. Nos casos confirmados na Bahia, observou-se maior ocorrência no mês de novembro, que concentrou 80% destes. No mesmo ano, o Estado de Pernambuco notificou seis casos suspeitos de Haff para o CIEVS.
Em 23 de dezembro de 2020, o relatório do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC) sugeriu que as evidências encontradas, tanto na detecção de palytoxina e ovatoxinas nas amostras quanto nos ensaios biológicos com a morte de animais, considerando principalmente as amostras de pratos prontos consumidos pelos intoxicados na Bahia e em Pernambuco, indicaram que os casos de toxinfecções alimentares podem estar associados com a presença de biotoxinas marinhas, porém, não se pode afirmar que a doença de Haff foi provocada por biomoléculas do chamado grupo Palytoxin-Like Toxins.
No ano de 2021, foram notificados 85 casos suspeitos de síndrome de Haff no País. Os casos foram registrados em oitos Estados: Pará, Amazonas, Bahia, Ceará, Alagoas, Pernambuco, Goiás e Rio Grande do Sul.
Até o momento, foram notificados três óbitos, sendo um no Amazonas, um no Pará e um em Pernambuco, conforme descrito (Tabela 1). Os dados disponíveis para a doença ainda são limitados com respeito à sua transmissibilidade, diagnóstico, gravidade e potencial impacto na saúde pública.
Tabela 1. Número de casos notificados de suspeita de doença de Haff por Unidade Federada (UF) em 2021.
UF
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Número de casos suspeitos de doença de Haff com sintomas rabdomiólise a esclarecer vinculados ao consumo de peixe
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Data do início dos sinais e sintomas do 1º caso identificado
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Data do início dos sinais e sintomas do último caso identificado
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Óbitos
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GO | 01 | 24/06/2021 | 24/06/2021 | 0 |
CE | 09 | 05/07/2021 | 21/08/2021 | 0 |
AL | 04 | 20/07/2021 | 29/08/2021 | 0 |
PE | 04 | 12/02/2021 | 18/02/2021 | 01 |
BA | 06 | 29/01/2021 | 30/05/2021 | 0 |
PA | 06 | 05/09/2021 | 05/09/2021 | 01 |
AM | 54 | 16/08/2021 | – | 01 |
RS | 01* | – | – | 0 |
Total | 85 | – | – | 03 |
Fonte: CIEVS locais. Elaborado por: CIEVS Nacional. Nota*: Caso de vínculo epidemiológico com consumo de pescado no estado da Bahia.
O consumo de pescado na Região Norte do Brasil é a base nutricional, econômica e cultural da população, além da exportação que não deve ser prejudicada, pois gera riqueza e renda aos diversos piscicultores e pescadores do Estado.
Portanto, informamos que, desde 2008, ano do registro do primeiro caso na Região Norte do País, não existe, até o momento, notificação da doença de Haff em Roraima, não havendo necessidade de restrição à população quanto ao consumo de peixes oriundos deste Estado.
RECOMENDAÇÕES SANITÁRIAS SOBRE O PESCADO
– Comprar peixes que possibilitem a rastreabilidade até o fornecedor
Os estabelecimentos deverão garantir a aquisição de pescados de fornecedores que assegurem a rastreabilidade, ou seja, que tenham condições de informar, por meio de registros, a origem e o transporte dos peixes comercializados. Assim, é importante que os estabelecimentos mantenham cadastros atualizados dos fornecedores, notas fiscais de compra e recebimento dos pescados, cópia da licença sanitária atualizada dos estabelecimentos fornecedores e dos veículos de transporte.
– Transporte
Garantindo as condições sanitárias necessárias à prevenção da qualidade e frescor do pescado. Os estabelecimentos devem adotar boas práticas de armazenamento e transporte do pescado:
O transporte deve ser realizado em condições tais que impeçam a contaminação e que protejam contra a alteração dos pescados;
Os veículos de transporte devem ser todos licenciados pelo órgão competente, possuir isolamento da cabine e compartimento para o transporte dos pescados, de material que permita a limpeza e desinfecção;
Os veículos poderão apresentar-se com isolamento térmico ou equipamento de refrigeração mantida a temperatura de conservação designada, devendo ser mantido o registro de temperatura do produto desde a origem até o destino;
Durante o transporte, o pescado congelado deve ser mantido a uma temperatura não superior a -18ºC.
– Armazenamento e conservação dos peixes
O pescado fresco deve ser conservado somente pela ação do gelo, mantido em temperaturas próximas à do gelo fundente, com exceção daqueles comercializados vivos. O gelo utilizado na conservação do pescado deve ser produzido a partir de água potável. O pescado resfriado deve ser mantido em temperatura de refrigeração por aparelhos que garantam a temperatura constante. O congelamento de pescado deve ser realizado por processos de congelamento rápido até atingir a temperatura de -18ºC, mantendo-se o pescado congelado nessa temperatura até a entrega ao consumidor.
O armazenamento dos pescados deve ser em local limpo e organizado, de forma a garantir proteção contra contaminantes. No caso dos pescados rotulados, seguir a temperatura indicada pelo fabricante, de forma que a cadeia de frios não seja quebrada.
– Características do peixe na hora da compra
O pescado fresco ou resfriado pode ser exposto à venda, desde que conservado sob a ação direta do gelo ou em balcão frigorífico.
O peixe ofertado ao consumo deve ter a superfície do corpo limpa e sem qualquer pigmentação estranha, os olhos claros, vivos, brilhantes e ocupando toda a cavidade orbitária, as brânquias ou guelras róseas ou vermelhas, úmidas e brilhantes, o abdômen firme, não deixando impressão duradoura à pressão dos dedos, as escamas brilhantes e bem aderidas à pele, a carne também firme e de consistência elástica, as vísceras íntegras, o ânus fechado, o peixe tem que ter o odor próprio e característico de cada espécie.
REFERÊNCIAS
1- Rosa, Nuno Guimarães, et al. “Rhabdomyolysis.” Acta médica portuguesa 18.4 (2005): 271-81. Disponível em: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/35943/1/2004%20-Rhabdomyolysis.pdf
2- Pei, LI Xiao Yan, LU Shuang Shuang, LIU Zhe, WANG Rui#, LU Xuan Cheng#, and LU Kai# The Emergence, Epidemiology, and Etiology of Haff Disease. Biomed Environ Sci, 2019; 32(10): 769-778. Chinese Center for Disease Control and Prevention, Beijing 102206, China. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0895398820300404
3- Buchholz U, Mouzin E, Dickey R, et al. Haff disease: from the Baltic Sea to the U.S. shore. Emerg Infect Dis, 2000; 6, 192−5.
Comunicação de risco Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde – CIEVS número 17, de 15/09/2021.
Nota Informativa nº 35/2021-CGZV/DEIDT/SVS/MS.
SECOM